Samara Faustino, líder da Associação dos Cortiços do Centro (ACC), fala sobre sua jornada há 20 anos
Seu capacete representa a força das mulheres na construção que já se estende por 6 anos (Foto: Milena Estela/ @milena_estela)
Por Gabriel Fomm
Mulher, negra, “do gueto”, como refere às suas raízes, mãe e líder. Essa é Samara Margareth Conceição Faustino, de 61 anos, que nasceu em São Paulo, mas o destino a trouxe aos cortiços do centro de Santos. Sua rotina atualmente é "cheia de emoções", como costuma falar brincando com os dramas e desafios que enfrenta. Ela vive em prol de uma função que jamais pensou em desempenhar. Com muito suor, grito e bom desempenho, Samara enfrenta uma nova batalha a cada dia para realizar o sonho de toda comunidade: uma moradia digna.
Samara mudou de sua cidade natal para Santos com meses de idade por conta de uma doença terminal desconhecida, porém, após seu batizado, teve uma mudança de diagnóstico e sobreviveu.
Ao se referir ao cortiço, afirma que as coisas eram diferentes na região. “Naquela época não era abandonado do jeito que ‘tá’, era um bairro mais limpo e eu não entendia que era feio. Eu morei em casa por alguns anos, tive altos e baixos [...] voltei com uns 20 e poucos anos, mas a minha família sempre morou no cortiço. Quando eu voltei para casa, já voltei diferente. Chega dessa vida que as pessoas passam e morrem”, referindo-se ao descaso do poder público que os abandonou na região para viverem escondidos em pequenos quartos até a morte.
Em 1997, descobriu pelo marido, a existência da ACC. Começou a frequentar as reuniões, até que três anos depois, entrou como secretária. “Fui escolhida, não oferecida”, diz Samara sobre sua entrada na direção da entidade. Segundo ela, isso só aconteceu devido ao pedido “do povo” por confiança nela e em sua personalidade, “não foi uma coisa que eu escolhi ir e que eu entendesse o que era estar lá, como secretária ou presidente. Eu só queria minha habitação e morar, igual todo mundo”.
Samara Faustino, a lutadora incansável pela moradia digna (Foto: Milena Estela/ @milena_estela)
Ao se lembrar de sua falecida mãe, Vilma, afirma ser sua maior inspiração, pois batalhava para manter sua casa com sete filhos e, ainda assim, brigava pelo que achava certo para manter a ordem na comunidade. Dona de uma personalidade forte, Samara diz com muito orgulho que herdou essas características dela.
Hoje, seu maior desejo é o “empoderamento molecular da comunidade”, para que todos tenham conhecimento de seu papel transformador e cobrem para que a lei seja exercida, garantindo direitos como cidadãos. Que cada indivíduo tenha seu protagonismo e seja seu próprio porta-voz.
Samara Faustino, representa esperança para os moradores dos cortiços de Santos (Foto: Milena Estela/ @milena_estela)
O famoso autor americano Lance Secretan, conhecido por suas teorias de influenciadores, afirma que “uma boa liderança é sobre experiências humanas. Não é uma fórmula ou programa, é uma atividade humana que vem do coração e leva em consideração os corações de outras pessoas. É uma atitude, não uma rotina”. Samara luta por um sonho comunitário de 181 famílias. Ela divide com todos a comemoração do que considera um êxito: o início das obras do conjunto habitacional Vanguarda e afirma que sua maior vitória “foi transformar o impossível no possível, sem candidaturas, filiações a partidos ou aceitando propinas [..] Os ‘bambambams’ não conseguiram e de repente eu, uma mulher negra do gueto, conquista isso com persistência, fé e muito foco. Eu não sonhei isso, eu nunca imaginei isso”, finalizou emocionada. Atualmente, a batalha é com “muitas emoções” para conseguir a retomada da obra que parou em 2013.
Que inspiração nos dá a Samara Faustino... E que trabalho o deste projeto de Jornalismo. Que primor de pautas, de texto, de fotos. Inspiração, também.